Carta
para o outro lado do muro
(o lado
oposto onde se encontram Dilma e Aécio)
Caro Jean Wyllys, não nos conhecemos, mas
nutrimos gostos comuns: sou militante do PSOL e também não gosto de muros.
Gosto de derrubá-los. Aliás, neste ano comemoramos o 25º aniversário da queda
do Muro de Berlim, derrubado pela ação revolucionária (mais uma vez) dos trabalhadores
alemães.
Teremos bastante trabalho pela frente, pois
há muitos muros que precisam ir para o chão. Tanto os reais, como aquele
erguido pelos sionistas israelenses em solo palestino, quanto os metafóricos,
como os preconceitos contra a comunidade LGBT e contra os povos indígenas.
Li a tua carta, onde fazes a opção pelo voto
em Dilma. E hoje pela manhã também li a decisão do Presidente do Tribunal
Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) cassando a liminar que havia interrompido
a construção da hidrelétrica de São Manoel, no rio Teles Pires, um dos
formadores do rio Tapajós. Em sua manifestação o Desembargador Cândido Ribeiro
alega que a paralisação da obra “tem o condão de acarretar grave lesão à ordem
e à economia públicas”. Para o magistrado a defesa da “ordem” e da economia
pública tem valor maior que a vida humana e o meio ambiente.
Para quem não acompanha o assunto, a Justiça
Federal do Mato Grosso, em decisão de primeira instância, no último dia 13/09,
havia determinado a suspensão das obras para o barramento do rio Teles Pires em
razão do “descumprimento da obrigação da consulta prévia, livre e informada aos
indígenas Munduruku, Kayabi e Apiaká, prevista na
Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)”. Essa decisão foi
derrubada, acatando-se recurso dos órgãos do governo Dilma.
Note-se que a tática utilizada
foi a mesma empregada largamente no período da ditadura civil-militar: a
suspensão de segurança. Em resumo trata-se do
seguinte: o presidente de um Tribunal derruba uma decisão judicial de instância
inferior, em favor de uma das partes, pelo simples fato de achar que aquela
decisão pode colocar em risco a economia do país. Sem julgar o mérito da
questão. Sem julgar se o motivo da disputa judicial é válido ou não. Essa
tática, abominável sob a luz da democracia, foi usada em dezenas de ações civis
públicas que tentavam impedir a construção da hidrelétrica de Belo Monte,
recheada de ilegalidades.
Fiz esse
breve esclarecimento, Jean, porque em tua carta afirmas que irás votar em Dilma
porque ela se comprometeu com cinco pontos, os quais enumeras. Dentre eles, um
me chamou a atenção, pois se refere a assunto no qual tenho me envolvido,
enquanto ativista de movimentos sociais. Falas que a presidenta Dilma “garantiu
que, desta vez, vai (...) dar maior
atenção às reivindicações dos povos indígenas, conciliando o atendimento a
essas reivindicações com o desenvolvimento sustentável”.
Jean, isso é MENTIRA do governo
Dilma. Os fatos que narrei acima comprovam isso (e posso te dar outros inúmeros
fatos, se preciso for). Os governos petistas tem insistido em passar por cima
das populações indígenas e ribeirinhas na Amazônia. Os governos petistas tem
passado por cima de pescadores e comunidades quilombolas. Os governos petistas
tem passado por cima dos povos da floresta, sempre que algum deles se coloca na
frente da implantação de qualquer grande projeto capitalista, em especial,
mineração, agronegócio e geração de energia.
No final da tua carta, escreves
que se a Dilma não cumprir esses compromissos serás o primeiro a cobrá-la,
junto com a gente. Não tenho dúvida quanto a isso, camarada. Tenho certeza que
poderemos contar contigo. Como tenho a certeza (em razão dos fatos recentes)
que um futuro governo Dilma não tomará partido das causas indígena e ambiental,
sempre que estas estiverem no caminho do agronegócio ou da mineração. Por isso,
Jean, não suja tuas mãos com sangue indígena, quilombola ou ribeirinho, que
inevitavelmente será derramado pelo governo petista, em harmonia com
latifundiários e madeireiros.
Não tenho a pretensão de que
mudes de opinião, se vieres a tomar conhecimento desta carta antes da eleição
(mas ficaria imensamente feliz se mudasses). Porém, se por acaso leres, te peço
que retires de tuas argumentações o suposto compromisso de Dilma em dar “maior
atenção” aos povos indígenas. Estás levando a milhões de trabalhadores, que te
ouvem e te respeitam, a ilusão de que em um segundo mandato Dilma iria virar as
costas para a turma do agronegócio assassino. Isso não ocorrerá.
Dizes que temos que “avaliar com
discernimento e escolher o lado do muro que está mais de acordo com o que se
espera da vida”. Tenho pleno acordo. O problema é que Dilma e Aécio estão do
MESMO lado do muro. Nós, socialistas, estamos do outro lado, junto com trabalhadores,
ambientalistas, povos indígenas; junto com os 99%; junto com a parcela da
população que diariamente é explorada, oprimida, violentada, saqueada. Esse é o
nosso lado.
Como disse antes, também não
gosto de muros. E muito menos de ficar encima deles. Votar NULO é tomar
posição! Posição contra uma falsa polarização entre esquerda e direita, que não
existe nesse 2º turno no Brasil. Há muito o PT deixou de ser “de esquerda”.
Pastores fundamentalistas? E o Bispo Macedo apoia quem? Ultrareacionários e
difamadores fascistas? Kátia Abreu é o quê, afinal? Política econômica liberal,
criminalização dos movimentos sociais, corrupção? Estamos falando de quem? PSDB
ou PT? Coligação com partidos da ultradireita? O PP (ex-ARENA) de Paulo Maluf é
base parlamentar de quem? No Pará o PT está em coligação com Jáder Berbalho e
com o DEM (também ex-ARENA). Em 2010 Levy Fidélix estava junto com Dilma no 2º
turno. Vai repetir o apoio? Que busquem qualquer adjetivação para a disputa
entre Dilma e Aécio, mas dizer que é Esquerda X Direita, isso não é.
Deixo claro que esta carta não é um insulto
ou ataque à tua posição. Abomino esse tipo de tratamento entre camaradas
socialistas. É apenas uma carta para expressar minha indignação com a forma de
tratamento que vem sendo dispensada aos povos indígenas pelos governos
petistas.
E é também uma carta de decepção, pois em
outros momentos senti orgulho em fazer postagens dizendo: “Jean Wyllys me
representa”. Entretanto, de hoje até o dia da votação do 2º turno, tu, Jean,
não me representas mais (e nem Freixo).
“Nem o passado como era, nem o presente como
está”.
“Nada deve parecer impossível de mudar”.
Voto NULO.
Mauricio Santos Matos
Ativista do Comitê
Metropolitano Xingu Vivo e do Movimento Xingu Vivo Para Sempre;
Membro do Setorial
Nacional Ecossocialista do PSOL
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